Tal como tenho feito todos os meses desde maio, aqui apresento as minhas leituras do mês de julho de 2023. Para além de livros que recebi das editoras, também irei falar sobre livros que estavam na pilha de leitura e também de alguns volumes de coleções que estou a acompanhar. Irei falar de todos os volumes presentes na seguinte foto exceto dos livros Frankenstein de Mary Shelley em que escrevi uma análise e O Corvo III - Laços de Família no qual também já escrevi num post dedicado a toda a série.
As muitas mortes de Laila Starr
Aqui Ram V e Filipe Andrade criam uma história em que o avatar da Morte é enviado para a Terra uma vez que a Humanidade está perto de descobrir o segredo para atingir a imortalidade. A morte irá então encarnar o corpo de Laila Starr, uma jovem mortal que vive em Bombaim. No entanto, dado que Laila está inconformada com a sua nova dimensão mortal, esta arranja forma de descer à Terra no momento em que o homem que irá descobrir a imortalidade nasce. Assim, Laila decide que irá acabar com a vida do bebé de modo a assegurar o seu trabalho e voltar a ser imortal. No entanto, na tentativa de matar o bebé, as coisas não correm assim tão bem e Laila acaba por morrer.
A história é desenvolvida ao longo de 5 capítulos em que Laila irá ter vários encontros com o homem que procura. No entanto, como a mesma morre nos vários episódios em que encontra este misterioso homem (daí o nome da obra), a mesma encontra-o em diferentes fases da vida, isto porque Laila não volta imediatamente à Terra após cada uma das suas mortes. Não há muito mais a dizer sobre o argumento, até porque o interessante deste volume é perceber como ambos os personagens mudam ao longo do desenrolar do mesmo. Mesmo assim, é incrível a qualidade dos diálogos de Ram V e a forma como este consegue acordar um tema tão forte como a mortalidade e limitação humana de uma forma tão inventiva e reflexiva ao mesmo tempo.
Mas talvez um dos maiores pontos de interesse para os leitores portugueses, sem descurar o excelente trabalho do argumentista, são as ilustrações de Filipe Andrade. Aqui o artista português concede um estilo muito próprio à obra aplicando um traço leve e fluído, o que ajuda a trazer alguma leveza ao tema abordado na história. Além disso, a paleta de cores é intensa e reflete perfeitamente a zona em que a narrativa de passa. Deste modo, tanto as cores como o traço criam um estilo que casa perfeitamente com a história e que, na minha opinião, é um dos melhores trabalhos gráficos publicados este ano no nosso mercado.
A edição da G Floy Studio Portugal é em capa dura, com boa encadernação e papel brilhante que realça o belíssimo trabalho de cores de Inês Amaro. Além disso apresenta uma extenso caderno de extras sobre a conceção da obra. Uma edição a não perder.
Poderão ver mais imagens deste álbum aqui: https://www.instagram.com/p/CuEfEGMMVVM/
As muitas mortes de Laila Starr é um livro com uma construção cíclica e que aborda de forma brilhante a vida e a morte. É um livro divertido e com uma arte belíssima que certamente deixará os leitores reflexivos mas com a certeza de que existe um lado bonito na própria mortalidade do ser humano. Sem dúvida um dos melhores do ano.
Meadowlark
Nesta história acompanhamos Jack "Meadowlark" Johnson e Cooper, o seu filho numa aventura que se passa na cidade de Huntsville no Texas. Meadowlark é um polícia e ex-combatente de boxe que se divorciou da mãe de Coop e que vive atormentado pelos erros do seu passado. Por sua vez, Coop é apresentado com um jovem na transição entre a adolescência e a vida adulta e que não sabe exatamente o que fazer da sua vida. Tal como a capa do álbum sugere, esta história trata-se de "um policial de autodescoberta", tanto para Jack mas principalmente para Coop, que é retratado na capa do mesmo.
Aqui temos uma história ao estilo crime noir e que se desencadeia após uma fuga na prisão onde Jack trabalha. Essa fuga acontece no momento em que Coop está nas instalações da mesma com o seu pai e ambos partem em busca dos criminosos. No entanto, existe uma relação entre o passado de Jack e os mesmos e que irá desencadear ainda mais a trama.
A apresentação dos personagens é boa, principalmente a relação entre Coop e os seus pais, bem como o companheiro da sua mãe. Por sua vez, é durante o desenvolvimento da história que Ethan Hawke explora a complicada relação entre pai e filho. Esta dinâmica é bastante interessante e complexa dado que, apesar de ser agressiva e disfuncional existe também uma vertente carinhosa na sua relação. Além disso, os erros e fantasmas do passado de Meadowlark voltam para o assombrar e este tem finalmente de os enfrentar e combater para finalmente conseguir ter o seu arco de redenção. Por sua vez, a jornada de Coop leva-o na tal jornada de autodescoberta anteriormente referida.
Greg Ruth tem um traço leve conseguindo equilibrar bem o uso de pincel e lápis ou caneta no seu traço. Deste modo as suas ilustrações conseguem equilibrar muito bem uma cidade pacata e calma com a extrema violência presente nas cenas de ação. Além disso, essa leveza dos backgrounds ajuda a que prenda a atenção nos personagens sem que o espaço em que eles se encontram pareça vazio. Até porque o grande foco aqui são os personagens e a expressividade dos mesmos é estonteante. Outro ponto que gostei bastante é o tom sépia que marca quase todo o livro (excepto nos flashbacks dos tempos de combate de Jack e do tempo em que os pais de Coop estavam juntos que são apresentados em tom de azul) e que confere um ar vintage a esta história.
A edição da G Floy Studio Portugal é em capa dura, com boa encadernação e papel mate que combina com as cores aplicadas na ilustração. Apesar disso, não se trata de uma edição rica em extras até porque tem apenas breves biografias dos seus autores. Não obstante, é uma edição muito bom.
Meadowlark é um daqueles livros do catálogo da editora que altamente recomendo. A história de Hawke é simples mas apresenta personagens complexos e com jornadas interessantes e plausíveis e Ruth conduz a história com a sua arte fantástica e que eleva o argumento apresentado. Uma graphic novel muito bem conseguida e que devem ler.
Poderão ver mais imagens deste álbum aqui: https://www.instagram.com/p/CujRc2WMDxU/
Deixa-me Entrar
Tal como no mês passado, este mês também li uma obra da autoria de Joana Afonso. No entanto, na obra O Baile a artista estava responsável apenas pelas ilustrações. Aqui, por outro lado, temos a estreia de Joana como artista a solo. Deixa-me Entrar foi originalmente publicado em novembro de 2014 pela editora Polvo.
Neste livro é apresentada uma história mais simples do que no álbum O Baile, no entanto trata-se de uma história mais pessoal e profunda. Alberto é um homem na casa dos 40 mas que não tem ligações afetivas com ninguém. Este vive numa pensão em Lisboa e, na sequência de uma inundação, é convidado pela dona da pensão a instalar-se num quarto no piso superior. Assim, acompanhamos a aproximação destes dois personagens e como isso irá mudar a vida de Alberto.
À medida que o tempo vai avançando, a dona da pensão começa a incluir Alberto na rotina quotidiana e estes passam tempo juntos nas refeições noturnas que antecedem as idas para o trabalho de Alberto como condutor de carro do lixo e também nos serões a assistir televisão. É esta aproximação que leva Alberto a sentir-se estranho com toda aquela mudança.
A temática abordado por este livro é a questão da solidão e a incapacidade de algumas pessoas em superarem momentos traumáticos da sua vida. Ao longo das várias sequências apresentadas neste volume, Joana consegue transmitir perfeitamente a dificuldade que Alberto sente em sair do "poço" em que se encontra. O trauma do protagonista é representado de forma criativa através das ilustrações da artista portuguesa, no entanto o único problema que vi neste volume foi o desenvolvimento da história na sua fase final. Senti que a inclusão de mais algumas páginas poderiam ajudar a construir melhor o argumento.
Algo que tenho de referir é as ilustrações deste livro. Acredito que o estilo de Joana não seja para o gosto de todos, mas particularmente gosto das ilustrações da autora. Os cenários são bem construídos e os personagens têm carisma. Os sentimentos dos mesmos são bem transmitidos através das ilustrações e combinam com o desenvolvimento dos personagens ao longo da obra. Não posso deixar de destacar o gatinho que aparece ao longo do livro e que é muito fofinho!
A edição da editora Polvo é em capa mole com encadernação boa e papel de qualidade. Particularmente não aprecio muito a ilustração da capa, no entanto acho o título da obra excelente e que condiz com a narrativa apresentada. Infelizmente a edição não apresenta nenhum extra.
Deixa-me Entrar é um bom livro apesar dos problemas que apresenta. Mesmo assim, nota-se claramente que este é o ponto de partida de Joana Afonso na sua jornada como artista completa e que evoluiu bastante até se tornar na artista dotada que é nos dias de hoje.
Poderão ver mais imagens deste álbum aqui: https://www.instagram.com/p/CuRt0-1M4or/
Hawk
Nesta história o protagonista é Vicente, um jovem desempregado, com família ausente, um relacionamento mal resolvido e que passa os dias na casa da sua recém-falecida avó. Vicente, que decidiu não enfrentar a morte da sua avó, apercebe-se que está perto de colapsar quando o seu pai anuncia a ida para o Brasil e que deixará de lhe pagar as sessões de psicanálise. Tudo muda quando, num fim-de-semana aparentemente normal, um falcão aparece e instala-se na sua casa.
Tal como o volume anterior, o grande destaque desta obra é a temática abordada. Sem dúvida que estamos perante uma geração de artistas que trouxeram temas importantes para a banda desenhada nacional e que desenvolvem os mesmo com bastante qualidade. Uma das coisas que mais aprecio é a capacidade de André em construir diálogos plausíveis entre os seus personagens, como uma discussão relativa à política económica do país. Mas a proposta da obra é retratar o isolamento e acomodação ao sofrimento vivido pelo personagem. Neste âmbito, o argumento consegue, dado o número de páginas da obra, cumprir a sua missão. Mesmo assim, tenho a certeza que o argumentista conseguiria causar um impacto maior nos leitores se a história se estendesse por mais páginas.
Ao diversas situações que o protagonista vive são banais mas ajudam a construir e transmitir o que o mesmo sente. Tal como referi o número de páginas não permite que haja um desenvolvimento maior destes momentos, não obstante André consegue trabalhar muito bem cada um destes. A presença do falcão e a forma como este entra na vida de Vicente têm um papel fundamental na direção que o argumento assume e que gostei bastante.
Falando agora das ilustrações, tal como no caso anterior, não creio que as mesmas irão agradar alguns leitores, como é o meu caso. Com isto não estou a criticar a qualidade das ilustrações mas sim a afirmar que o estilo de ilustração de Osvaldo não é aquele que mais aprecio. Tendo isto em conta, acho que as ilustrações e principalmente a expressividade facial consegue reforçar o estado de espírito dos personagens, particularmente o protagonista. Aqui a obra é quase irrepreensível. Mesmo assim, acho que a simplicidade de alguns cenários empobrece a arte deste livro, apesar de achar que Osvaldo apresenta capacidade de mostrar bons cenários em algumas vinhetas, nomeadamente em espaços abertos. Apesar disso, é de destacar o papel das cores de Inês que consegue "melhorar" o vazio desses cenários e que concede os tons necessários ao próprio tom da história.
O Mercenário Vol. 4: O Sacrifício
Este volume dá sequência ao universo apresentado e desenvolvido ao longo dos 3 volumes anteriores. Neste volume o Mercenário tem de resgatar uma criança de uma seita fanática, o que irá despertar algumas memórias do passado do protagonista. Aqui temos uma história simples (como nos outros volumes) mas que dá uma leitura agradável aos leitores dados os elementos que caracterizam esta série: as criaturas fantásticas, as sequências de ação e todos os elementos técnicos que o autor tão bem domina.
Apesar disso, o facto de ser abordado, mesmo que ao de leve o passado do nosso guerreiro, torna este volume um dos melhores até ao momento. Digo isto principalmente pela capacidade do autor em criar boas cenas de ação. Mesmo que o traço seja pouco dinâmico, o argumento consegue passar a sensação de perigo constante inerente à missão de resgate. Vemos também o regresso de caras conhecidas e o desenvolvimento da história pavimenta e desenvolve ainda mais a história que o artista pretende desenvolver.
No que diz respeito à arte deste volume, aqui temos o ponto alto da série. O artista espanhol recorre a uma técnica de pintura a óleo que torna cada vinheta numa autêntica obra prima. Além disso, como a série aposta muito em sequências de ação, o artista recorre da narrativa gráfica para desenvolver essas mesmas sequências. Além disso, este tipo de ilustração concede à série uma identidade visual muito própria, sendo assim criado um universo particular repleto de criaturas fantásticas, paisagens e arquiteturas belíssimas, muita violência gráfica e mulheres majestosas. O único ponto negativo (e que de certa maneira é um pouco irónico) é a falta de dinamismo das ilustrações que afeta as sequências de ação.
A edição da Ala dos Livros é, mais uma vez, magnífica. Para além da capa dura e do papel e encadernação de excelente qualidade, a lombada apresenta uma textura diferente e que casa perfeitamente com a temática dos livros. Mas se a nível gráfico a edição é excelente, os cadernos de extras também o são. Aqui, Segrelles narra na primeira pessoa as técnicas, materiais e ideias que teve ao longo da conceção destes álbuns. Sem dúvida dos melhores cadernos de extras presentes nos lançamentos nacionais.
Poderão ver mais imagens deste álbum aqui: https://www.instagram.com/p/CupSIVKsM4z/
Mesmo com argumento simples, este volume é uma boa leitura e que recomendo. Apesar de não ser uma história com personagens e tramas complexas, a arte de Segrelles, por si só, já vale a leitura deste volume.
Leram alguns destes livros?
Quais foram as vossas leituras de julho?






















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